A Convenção da Objetividade

Enunciado: "Para procedimentos igualmente relevantes, resultantes da aplicação dos Princípios, preferir-se-ão, em ordem decrescente:

  • a) os que puderem ser comprovados por documentos e critérios objetivos;
  • b) os que puderem ser corroborados por consenso de pessoas qualificadas da profissão, reunidas em comitês de pesquisa ou em entidades que têm autoridade sobre princípios contábeis…"

Como vimos em outro tópico, a Contabilidade é um árduo exercício para maximizar a relevância, a praticabilidade e a objetividade.

Quanto à restrição da objetividade, a fim de que as demonstrações contábeis sejam tão confiáveis quanto possível, os contadores necessitam decidir sobre o atributo ou evento que será mensurado e selecionar procedimentos de mensuração adequados.
Segundo Hendriksen, a objetividade tem sido conceituada de maneiras distintas por pessoas e contadores diferentes, a saber:

  • § mensurações e avaliações de caráter impessoal ou que se configuram fora do pensamento da pessoa ou pessoas que as estão realizando;
  • § mensurações baseadas no consenso profissional de experts qualificados;
  • § mensurações e avaliações baseadas em evidências e documentação verificável;
  • § valor da dispersão estatística das mensurações de um atributo, quando efetuadas por vários pesquisadores.

Em seu primeiro aspecto, não é muito fácil, na prática, separar completamente a qualidade intrínseca do que está sendo mensurado das crenças, mesmo que científicas, do pesquisador.

Assim, afirmamos que o ponto de transferência é o mais objetivo para o reconhecimento da receita, pois existe um valor de mercado que independe da pessoa do avaliador. Embora isso seja verdadeiro, o pesquisador precisa tomar decisões sobre o valor do ativo que está sendo dado em troca. Assim, mesmo esse sentido de objetividade pode conter em si algo de subjetivo.

Quanto ao segundo aspecto, talvez seja o que tenha maior peso no estágio atual de desenvolvimento da disciplina. Caracteriza-se como sentido de objetividade típico de uma disciplina praticada por profissionais liberais. Assim, se, através da reunião de vários experts em comitês de pesquisa, chegar-se a consenso sobre certo procedimento ou mensuração, mesmo que tais mensurações ou critérios não sejam suportados por evidências objetivas (no sentido mais material e restrito do termo), ainda assim, por representarem o resultado de um processo psicossocial de percepção por parte de segmento autorizado da profissão, tornam-se objetivos.

No que se refere ao terceiro critério, a ênfase consubstancia-se mais na evidência do que na mensuração em si. De novo, a receita é reconhecida na base da transferência como evidência. Segundo Hendriksen, embora a evidência possa ser verificável, a seleção do critério de evidência como base pode ser objeto de viés pessoal.

Quanto ao quarto aspecto, a maior ou menor objetividade de um critério de mensuração pode ser avaliada pelo desvio-padrão em relação à média do atributo que está sendo mensurado. Pode acontecer, todavia, que o próprio valor da média não retrate adequadamente o atributo considerado. Por exemplo, consideremos que estamos avaliando a objetividade dos critérios tradicionais de avaliação de estoques conhecidos como PEPS, UEPS e média ponderada. É possível que um dos três revele um menor desvio-padrão com relação à média. Isto apenas significa que as mensurações são mais verificáveis, mas não necessariamente objetivas, cientificamente falando. Pode até ocorrer que um critério de mensuração baseado, digamos, no custo histórico corrigido apresente maior desvio, mas menor viés. Esse último é determinado pelo desvio relativo entre o valor da média, caracterizado pelo procedimento de mensuração utilizado e o "verdadeiro" valor de média do atributo que está sendo mensurado. Como, todavia, o verdadeiro valor da média não pode ser determinado, a diferença entre a média estimada e a verdadeira precisa ser calculada na base do julgamento subjetivo e das relações lógicas entre o procedimento de mensuração e o atributo que está sendo avaliado.

Freqüentemente, na prática, devemos contentar-nos com sentidos menos científicos da objetividade. É evidente que os comitês de experts, antes de emitirem opiniões sobre princípios e procedimentos contábeis, podem utilizar-se dos critérios estatísticos focalizados no quarto sentido da objetividade.

Não existem dúvidas, todavia, de que a profissão precisa perseguir um sentido de objetividade que caracterize de forma mais nítida a Contabilidade como uma ciência social.

Nesse aspecto, é importante que os relacionamentos entre causas e efeitos dos eventos da natureza que afetam os estados patrimoniais tenham explicações convincentes e que tais eventos possam ser reproduzidos em ambiente de pesquisa social e suas resultantes possam ser previstas.

A Contabilidade, assim, deverá chegar a um ponto de sua evolução no qual será possível enunciar as "leis" que relacionam causas e efeitos. De certa forma, os postulados, princípios e restrições são uma variante simplificada de tais leis. O ideal, todavia, seria a formulação axiomática da teoria da Contabilidade, já tentada por raros autores e em vias de aperfeiçoamento, nos estudos atuais, rumo a uma explicitação mais adequada.

Não se questiona, todavia, o sentido mais prático e "profissional" atual da objetividade, conforme apresentado em seu enunciado. A Contabilidade, em igualdade de procedimentos quanto à sua relevância, preferirá os que puderem ser suportados por algum tipo de evidência considerada objetiva (documentos, normas, escritas, consenso profissional etc.).

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